quinta-feira, 1 de julho de 2010

Quem conta um conto...

Não sou escritora, embora sonhe e goste de sonhar, e certo dia me deparei com uma anúncio de um concurso de contos... e pensei: porque não?
Escrevi, e meu texto não foi selecionado entre os 40, mas mesmo assim só o fato de ter enviado meu humilde continho, já me fez feliz... inesplicável alegria da coragem...  Hoje saiu o resultado e agora, meu texto veio parar aqui... mesmo não estando na lista dos 40 mais mais, vou na contra mão da lógica, que também é via dupla. Então lá vai...

Os olhos do dentista.


Ela tinha nove anos, e gostava de ir ao dentista. Não era coisa comum entre as crianças da sua idade. A falta de cuidados na infância lhe causou algumas cáries, mas ela não via todo o risco que se escondia ali. Gostava de ir ao dentista. Na sala de espera o sofá era um tablado de madeira forrado com carpete que dava a volta em toda a sala, sem almofadas. Não era confortável, mas ela não se importava. Levava sempre um caderno pra fazer a lição de casa, ou simplesmente pra desenhar enquanto esperava. O silêncio era quebrado pelo barulho dos instrumentos, do motorzinho da broca ou por vozes abafadas. O cheiro do lugar era inconfundível. Cheiro do carpete e dos produtos de limpeza, cheiro de remédio e de pessoas. Ela também não se importava, invariavelmente o seu nariz estava trancado...
Aguardava pacientemente até ouvir alguém chamando lá de dentro.
Quando ouvia seu nome, levantava, recolhia o caderno e os lápis, guardava na mochila, e entrava no largo corredor. Primeira, segunda, terceira porta a direita. Eram oito passos, entrava. A luz branca e fria dava ao lugar um aspecto de sonho, de mundo paralelo. Sentava na cadeira, respirava fundo puxando o ar pela boca e olhava para olhos do dentista. Eram olhos azuis. De um azul tão limpo e claro que pareciam uma piscina. Logo perdia o foco e só via, refletido no vidro dos óculos dele, a sua boca aberta, os dentes lá dentro dela, a mão dele a trabalhar. Como um pequeno aprendiz olhava o que ele fazia com tanta atenção que parecia conhecer todo o procedimento. Ela conhecia sua boca, pelos olhos claros do dentista.

6 comentários:

  1. Parabéns pelo seu conto. Muito bonito e nos dá a condição de imaginar cada detalhe... Muito legal. Te Amo.

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  2. Também gostei Josi...especialmente do final. Lembra um pouco Narciso que usava o lago para ver-se refletido. Beijocas!

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  3. Josi
    Tb. sou como vc.; Adoro escrever e tb. mantenho firme a idéia de que algum dia meus contos possam se transformar em um livro.
    Gostei da forma como vc. escreveu, prendeu a atenção e foi possível imaginar os detalhes.
    Parabéns!
    bjk e lindo final de semana

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  4. Uau! Lendo a gente vai junto com a personagem, arrastados para a cadeira do dentista, mesmo a contragosto :)) Muito bom!

    Beijinhos

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  5. Josi, que texto lindo. Quanta delicadeza!! Amei! Se eu fosse da comissão organizadora, o seu conto estava entre os 20 melhores, concorreria ao prêmio máximo de igual para igual. E tenho dito!
    Beijos.

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  6. Edno
    eu também te amo...

    Taia, Obrigada. Que bom que é despertar outros pontos de vista! Um idéia puxa outra...

    Santinha! Obrigada! Você vai escrever seu livro sim, porque não?

    Mirian, "mesmo que seja a contragosto" foi ótimo!! hehehe
    Obrigada!

    Tati!, já me senti como se tivesse ganho o nobel de literatura!!! tamanha alegria, Obrigada!!

    Gente, obrigada mesmo pelo carinho de vocês... um beijinho
    Josi

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